(Por Donaldo Ritzmann)
O “VINTE E UM” (Km21 da Estrada da Serra) nas encostas da Serra do Mar, tornara-se um conceito. Uma casa colonial, instalada pelo Bauer, adquirida pela Tia Lena (Magdalena Ritzmann Olsen) para seus pais Jacob e Magdalena, passando em seguida para as mãos de nosso pai (Ernesto Ritzmann).
Era uma construção típica daquela época, com uma cumeeira para a frente da estrada e duas para os lados, com tijolos à vista, onde os carroções de São Bento, os famosos “São Bento-Wagen” faziam as suas paradas após descerem a Serra ,desatrelando os cavalos; onde o trole de passageiros e correio do Sr. Monich de Joinville (a Postkutsche), que fazia o trajeto entre esta cidade e São Bento tinha a sua parada obrigatória; onde o tio Erico e o João Tauber passavam as suas férias escolares com grandes caçadas programadas. Era um lugar calmo e aprazível, com vasto bananal nos fundos, seguido por enorme taquaral e uma exuberante floresta.
Os morros nos fundos da propriedade, que este paraíso verde ostentava, desnorteavam as bússolas pela existência neles de minério de ferro.
Ao lado, esta propriedade fazia divisa com o cemitério da Comunidade Evangélica e do lado oposto, com um pequeno tanque, formado por um córrego que tinha sua nascente entre os morros, permitindo vez por outra a pesca de um lambarí pertencente a uma espécie que tinha o rabo perto da cabeça. Uma variedade que o cientista Martius,( que acompanhou a princesa Leopoldina quando a mesma veio para o Brasil) deixara de classificar.
O armazém era amplo, com um grande balcão em forma de L, com um bom sortimento de fazendas, chitas, riscados, lampiões , panelas, querosene, víveres e uma infinidade de artigos de primeira necessidade, procurados pelos colonos imigrantes daquela região.
É importante lembrar que um banco colocado em frente ao balcão , acompanhava toda extensão deste. Nos fundos, de um lado o armazém, e do outro a cozinha, dando a porta lateral desta para um pequeno cafezal sombreado, cuja produção atendia ao consumo da família. O estoque era reposto com compras em Joinville, que já possuía boas casas comerciais: Trinks, Schlemm, Richlin, Bornschein, Schneider. Os fósforos eram comprados soltos, em sacos, e por isto as caixas vazias eram guardadas e reaproveitadas.
De vez em quando se matava um porco de criação própria para o fabrico de banha, linguiça, lombo enfumaçado, geleia (Sulze) e dos restos inaproveitáveis fazia-se sabão. Uma vaca dava o leite para os pirralhos e o consumo da casa.
Havia ainda um salão para bailes e festas organizadas pela Sociedade dos Atiradores. Entre a casa comercial e o salão existia um grande pátio, com uma velha laranjeira e um pé de tangerina, cheios de bromeliáceas, orquídeas, musgo, barba de velho e outros epífitos e parasitas que cresciam viçosos como a vegetação exuberante daquela planície. Dali se avistavam os morros azulados da serra do Mar. Apesar desta carga de vegetais que nestas árvores tinham seu habitat, gostosas frutas nelas amadureciam.
Nos fundos, entre a venda e o salão achava-se o chiqueiro, a estrebaria, o galinheiro, a marcenaria e outras dependências necessárias para o bom andamento do negócio.
Mas, apesar de dizermos que o local era calmo e aprazível, os afazeres do casal eram muitos, e diversificados. Em atender o negócio, a cozinha, os animais, os dois rebentos (o Bubi e o Herbert) , pois eu, (o Donaldo) naquela época já estava em São Bento na casa do avô, a mamãe (Targina) , tinha uma disposição incomparável, indômita, para o trabalho, que mantém até hoje.
Minha mãe além de todo este gigantesco trabalho que realizava , ainda tinha vontade e necessidade de leitura, que praticava à noite à luz do lampião fumegante, que colocava no chão ao lado da cama, para não incomodar o marido. Lia até altas horas da madrugada, se não até clarear o dia. Apagava rapidamente o lampião quando papai reclamava e o reacendia quando ouvia a respiração tranquila e compassada ou mesmo o ronco dele.
(E este relato continua com o acontecimento do “monstro” que contamos separadamente em “curiosidades”.)